O palhaço, o país e a busca de identidade
José Geraldo Couto
04.10.11
Dois filmes novos vistos na bela mostra Cine BH parecem não ter nada a ver um com o outro, mas dialogam entre si de modo enviesado e sutil. Estou falando de O palhaço, de Selton Mello, que abriu o evento mineiro na última quinta-feira, e de Meu país, de André Ristum, que entra em cartaz dia 7 de outubro. O filme de Selton Mello, o segundo dirigido pelo ator, é, na superfície, um road movie encantador, acompanhando um circo mambembe em sua errância pelo interior de Minas Gerais. Selton é Benjamin, o palhaço Pangaré, filho e parceiro do dono do circo, o veterano palhaço Puro-Sangue (Paulo José).
Primavera nas telas
José Geraldo Couto
27.09.11
Esta coluna, que estreia e pretende abordar o cinema em suas várias manifestações e desdobramentos, saúda esta primavera brasileira e convoca os leitores a experimentar e discutir seus frutos. Do ponto de vista de quem gosta de cinema, o Oscar é o de menos. Mas a relação de títulos que concorriam à indicação brasileira à estatueta de melhor filme estrangeiro deixou muita gente deprimida, e com razão. Foi, com raras exceções, uma safra desanimadora. A boa notícia é que (...) veio à luz uma leva de boas produções das mais variadas tendências.
Observações de um outsider
José Geraldo Couto
15.09.11
Muitas das pessoas de outras áreas com que me relaciono - escritores, cineastas, músicos, scholars, outros jornalistas - se espantam quando digo que escrevo também sobre futebol, como se este fosse incompatível com as artes e com o intelecto de um modo geral. Chegam a me olhar com certa condescendência, como quem perdoa um pequeno vício de uma pessoa a quem se preza. (...) A gente não precisa se desculpar um com o outro para dizer que Zidane é um artista, que Garrincha é um poeta, ou que Pelé escreveu com os pés um épico digno de Tolstoi.
A Borges o que é de Borges
José Geraldo Couto
08.09.11
A prática continuada de determinado ofício, o exercício de determinado meio de expressão, dá ao artista um olhar privilegiado, uma sensibilidade aguçada para os trabalhos de seus pares. (...) E essas visões de artistas por outros artistas são muitas vezes idiossincráticas, passionais, desequilibradas. Nem sempre podem ser tomadas como parâmetro crítico. Um exemplo (...): Bioy Casares, o grande parceiro e amigo de Borges, não gostava da literatura do Macedonio Fernández. Assim como Bergman não gostava do cinema de Orson Welles, Buñuel não gostava de Rossellini, e Godard não gosta de Kubrick.
É proibido proibir, mas não opinar
José Geraldo Couto
01.09.11
Que fique claro: não estou criticando esta nova situação, nem lamentando nostalgicamente o fim da arte do passado. Para mim, a maior babaquice é suspirar pela "Arte", ou pelo "Belo", escritos assim, com maiúsculas, e vistos como entidades abstratas, a-históricas. Penso que cada obra de arte - ou cada objeto estético, cada artefato expressivo, cada manifestação material do espírito, como quiserem chamar - cria suas próprias regras, sua própria lógica, seus próprios critérios e valores. Se conseguir tocar a sensibilidade e a inteligência de outros, muito bem. Se não conseguir, paciência.
Há arte demais no mundo
José Geraldo Couto
25.08.11
Claro que todo mundo tem o direito de expressar seus sentimentos - e ressentimentos -, suas ideias banais ou extravagantes sobre a vida na terra. (...) Mas a arte, a arte é outra coisa. Basta ler uma estrofe de João Cabral de Melo Neto, ou um parágrafo de Guimarães Rosa, ouvir uma frase musical de Tom Jobim, ver um travelling de Stanley Kubrick, para imaginar quanto de esforço intelectual, quanto de educação dos sentidos foi investido ali, para além do talento natural de seus criadores. Temo que me chamem de elitista, acadêmico ou passadista, mas concordo com o artista plástico Luiz Paulo Baravelli, que uma vez declarou que "há arte demais no mundo".
Luxo para todos
José Geraldo Couto
19.08.11
Devo confessar, porém, que vou pouco ao teatro. Não chego a ser da turma do "Vá ao teatro, mas não me convide", mas quase sempre acabo optando pelo cinema na hora de sair de casa. No cinema, se o filme for aborrecido, a gente pode cochilar ou sair no meio sem criar constrangimento. No teatro, somos frequentemente acometidos pela "vergonha alheia", quando não pelo ímpeto de subir ao palco e esganar certos atores, ou pedir a cabeça do diretor.
Escritores no set
José Geraldo Couto
11.08.11
Até hoje há quem diga que só livros ruins rendem filmes bons - e um exemplo muito citado é o dos ótimos filmes de Hitchcock inspirados em obras medíocres de Daphne Du Maurier (Estalagem maldita, Rebecca, Os pássaros). Mas há os contraexemplos incontestáveis: de Morte em Veneza (Mann/Visconti) a Vidas secas (Graciliano/Nelson Pereira), são inúmeros os casos de filmes que dialogaram de igual para igual com as obras-primas que os inspiraram. (Isso para não falar dos livros ruins que geraram filmes igualmente ruins.)
Todas as primaveras
José Geraldo Couto
04.08.11
Puxa, você esteve em Paris em maio de 68 e em Praga na primavera do "socialismo com rosto humano" - e voltou com essas coisas todas na cabeça para o sombrio Brasil dos generais. É sempre temerário fazer paralelos entre a obra de um artista e sua vida pessoal, ou deduzir aquela desta, mas não posso deixar de ver uma coerência profunda entre a tua vivência de experiências de liberdade e o caráter essencialmente libertário da tua literatura.
De Fidel a Neymar
José Geraldo Couto
28.07.11
Que maravilha essa sua história com o Fidel Castro, não só o encontro em Havana, mas também o destino da foto do "grande comandante". Acho que esse episódio sintetiza todo um processo, o do entusiasmo e posterior desencanto da sua geração e da minha (que, afinal, talvez sejam a mesma) com Fidel, Cuba, o comunismo, o marxismo.
